Dos ciclos solares aos mistérios de buracos negros: o comportamento dinâmico das estrelas
28 Novembro 2025A compreensão humana sobre o universo começa, inevitavelmente, pelo estudo da nossa própria estrela. O Sol, longe de ser uma esfera estática de luz, respira em ritmos complexos que a ciência levou séculos para decifrar. O que hoje chamamos de ciclo solar — a alternância periódica na atividade magnética da estrela a cada 11 anos — não é uma descoberta recente, mas o culminar de observações que remontam à antiguidade.
Registros históricos indicam que astrônomos chineses já notavam manchas na superfície solar muito antes de Galileu Galilei documentar o fenômeno em seus esboços pioneiros. Contudo, a percepção de que essas manchas obedeciam a um padrão temporal só se solidificou em 1843, quando Samuel Heinrich Schwabe, após dedicar 17 anos a observações contínuas, identificou a periodicidade na variação do tamanho e quantidade dessas marcas escuras.
A matemática do caos solar
A sistematização desse conhecimento avançou em 1852, com a criação do sistema de contagem por Rudolf Wolf, que estabeleceu o ciclo iniciado em 1755 como o “número 1”. Desde então, a ciência monitora o comportamento do Sol, que oscila entre fases de mínimo e máximo solar. Embora a média seja de 11 anos, a natureza não é exata; um ciclo pode durar de 9 a 14 meses a mais ou a menos, assim como suas fases internas de calmaria ou agitação.
Durante o máximo solar, o risco de tempestades geomagnéticas aumenta drasticamente. O rompimento e a reconexão de filamentos magnéticos na superfície da estrela geram erupções violentas e ejeções de massa coronal. Esses eventos liberam radiação ultravioleta, raios-X e partículas carregadas que viajam pelo Sistema Solar. Quando essa torrente energética atinge a Terra, ela interage com nosso campo magnético. Embora este escudo natural nos proteja dos impactos mais agressivos, as linhas de campo se fecham nos polos, permitindo que partículas penetrem na atmosfera e causem tempestades solares.
A preocupação dos astrônomos vai além da curiosidade científica. A capacidade de prever essas oscilações é vital para a proteção da infraestrutura moderna, uma vez que tais eventos podem danificar satélites, espaçonaves e até derrubar redes elétricas em solo.
Quando a luz conta uma história contraditória
As mesmas técnicas de análise de luz e vibração que usamos para entender o Sol são aplicadas a objetos muito mais distantes, mas nem sempre os resultados são coerentes à primeira vista. Estudar a luz das estrelas geralmente nos revela sua temperatura, composição e idade. No entanto, um sistema de buraco negro descoberto recentemente, o Gaia BH2, apresentou aos cientistas um enigma que desafiou os modelos tradicionais de evolução estelar.
A estrela gigante vermelha que orbita esse buraco negro conta duas histórias diferentes. Sua química está repleta de “elementos alfa”, assinaturas típicas de estrelas antigas formadas quando o Universo era jovem. Baseando-se apenas nessa composição, ela deveria ter cerca de dez bilhões de anos. Por outro lado, astrônomos da Universidade do Havaí, utilizando o satélite TESS da NASA, mediram as vibrações que ecoam no interior do astro — uma técnica chamada asterossismologia.
Assim como os terremotos revelam a estrutura interna da Terra, os “terremotos estelares” fazem o brilho da estrela oscilar sutilmente, expondo seus segredos mais profundos. Surpreendentemente, esses dados indicaram que a estrela tem apenas cinco bilhões de anos.
Um passado de violência oculta
Daniel Hey, autor principal do estudo publicado no The Astrophysical Journal, aponta que estrelas jovens ricas em elementos alfa são raras e intrigantes. A explicação para essa juventude aparente combinada com uma química ancestral sugere que o astro não evoluiu isoladamente. A chave para o mistério estava na rotação: telescópios terrestres mostraram que a estrela gira uma vez a cada 398 dias, uma velocidade muito superior à esperada para uma gigante vermelha isolada dessa idade.
O cenário mais provável é que esta estrela tenha passado por um evento traumático, como a fusão com outra estrela ou a absorção de grandes quantidades de material quando o buraco negro se formou a partir de seu companheiro anterior. Esse processo teria injetado massa extra — explicando a química incomum — e aumentado seu momento angular, acelerando sua rotação.
Sistemas como o Gaia BH2 são classificados como buracos negros “adormecidos”. Diferente dos buracos negros ativos que engolem vorazmente seus vizinhos e emitem raios-X, estes são silenciosos e difíceis de detectar. Sua descoberta só foi possível graças à missão Gaia da Agência Espacial Europeia, que mediu o movimento sutil da estrela companheira orbitando o objeto invisível e massivo.
A equipe também investigou o Gaia BH3, outro sistema adormecido com uma companheira ainda mais estranha e pobre em metais, onde as oscilações previstas pela teoria não foram detectadas. Isso indica que nossos modelos atuais podem precisar de revisão. Futuras observações do TESS prometem conjuntos de dados mais longos, que poderão confirmar essas hipóteses de fusão e revelar se outros sistemas silenciosos espalhados pela galáxia também escondem um passado de colisões estelares que buracos negros mais ativos já teriam apagado há muito tempo.

